Almir Pazzianotto Pinto

Direito de petição

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O direito de petição é essencial ao Estado Democrático. Vamos encontrá-lo nos incisos XXXIII e XXXIV do art. 5º da Constituição. Diz o primeiro: “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral que serão prestadas, no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”. O segundo prescreve: “São a todos assegurados, independente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos poderes públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder”.

A clareza dos dispositivos revela que o poder constituinte, emanado do povo, desejou dar ênfase a uma das garantias fundamentais do cidadão, ou seja, receber do agente público resposta a pedido de informação acerca de assunto de interesse particular ou coletivo.

Em contrapartida ao direito de o cidadão peticionar, o servidor público está obrigado a oferecer resposta dentro do prazo legal, ou de prazo razoável. Veja-se a regra do inciso LXXVIII do art. 5º: “A todos, no âmbito judicial ou administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Quando peticiona o cidadão não pode deixar de ser atendido mediante resposta fundamentada, redigida em termos protocolares. Não basta dizer sim ou não. A Constituição obriga a dizer o porquê.  Não é o que se observa na prática. Refiro-me em particular à Administração Pública Federal, cujos ministérios e secretarias, sediados em Brasília, estão distantes e procuram de alhear ao que se passa no Brasil real. Um dos traços característicos da nossa cultura política reside na postura do agente público – ressalvadas  as exceções – caracterizada pela errada presunção de superioridade emanada do cargo. Servidores de média e baixa hierarquia, colocados detrás da escrivaninha ou do guichê, comportam-se como pequenos imperadores, ignorando os direitos dos contribuintes.

Escrevi vários artigos sobre a questão do trabalho análogo ao escravo. Trata-se de crime contra a liberdade pessoal, punido com pena de reclusão. Ao acusado, porém, deve se assegurar o devido processo legal e garantir o pleno direito de defesa (Constituição, art. 5º, LIII, LIV, LV, LVI).

Enraizada tradição construída pelo autoritarismo, faz com que algumas autoridades se esqueçam dos fundamentos do regime democrático, um dos quais consiste no princípio da legalidade. Portaria ditatorial do extinto Ministério do Trabalho, baixada no governo da presidente deposta Dilma Roussef, violou as garantias constitucionais e criou cadastro conhecido como “lista negra” ou “da maldade”, para registro público e infamante de nomes de pessoas físicas e jurídicas após mero processo administrativo.

Vazado à imprensa, o Auto de Infração permanecerá meses no limbo de alguma Superintendência Regional do Trabalho, à espera de decisão, ou será alvo de Ação Anulatória. A morosidade administrativa é deliberada; visa a manchar o nome da pessoa acusada, com o propósito de lhe causar o maior prejuízo possível.

Após receber sentença judicial de absolvição, a empresa faz o que lhe compete: peticiona à Secretaria do Trabalho, junta o acórdão que a inocenta, mas não consegue resposta. A autoridade ministerial recorre ao silêncio para não despachar, deferindo-a ou lhe negando provimento.

O Brasil não será República Democrática enquanto o governo não tratar o cidadão com o respeito que a Constituição lhe assegura. Responder a petição regularmente protocolada é o mínimo que se espera do agente zeloso das suas obrigações como servidor do público.

Almir Pazzianotto Pinto é advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho. Autor de A Falsa República.

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