Poluídos como os oceanos

Plástico chega a intestino humano e podemos estar contaminados, diz estudo

Acumulados no trato intestino, esses materiais interferem na resposta imunológica do intestino, além do perigo da absorvição de produtos químicos tóxicos e patógenos

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Projeto do deputado Luiz Lima permite a fabricação apenas de produtos feitos com plástico biodegradável.

Nós podemos estar cheios de microplásticos no nosso corpo, assim como os oceanos, segundo um estudo inédito, apresentado nesta terça-feira, 23, liderado pelo médico Philipp Schwabl, pesquisador da Divisão de Gastroenterologia e Hepatologia da Universidade de Medicina de Viena, na Áustria, em parceria com a Agência Ambiental da Áustria. E esses minúsculos pedaços de plástico chegam ao nosso organismo pelo intestino. As informações são da agência de notícias BBC News Brasil.

Vilões do meio ambiente, os microplásticos são resíduos degradados de diversos tipos de plásticos, com menos de 5 milímetros. Originárias de fontes diversas como roupas sintéticas, pneus, tintas e escovas de dente, essas partículas estão se amontoando nos oceanos, contaminando toda a vida marinha.

O estudo foi realizado com base em coletas de fezes de oito pessoas de oito países diferentes. Em todas as amostras foram identificados microplásticos – de até nove tipos diferentes -, partículas de polipropileno (PP) e polietileno tereftalato (PET), entre outros. Os participantes são habitantes de Finlândia, Itália, Japão, Holanda, Polônia, Rússia, Reino Unido e Áustria.

A presença de microplásticos no organismo humano pode afetar a saúde, conforme ressaltam os pesquisadores. Acumulados no trato gastrointestinal, esses materiais têm a possibilidade de interferir na resposta imunológica do intestino – além, é claro, do risco proporcional pela absorção de produtos químicos tóxicos e patógenos pelo nosso corpo.

“Existem estudos com animais que mostram que partículas de microplástico são capazes de entrar na corrente sanguínea, no sistema linfático e de atingir até o fígado. Além disso, estudos com animais também demonstraram que os microplásticos podem causar danos intestinais, alteração nas vilosidades intestinais, distorção da absorção de ferro e estresse hepático.”

Método

Todos os participantes eram adultos saudáveis, sem nenhuma dieta médica. Eles também não podiam ter tomado antibióticos nas últimas duas semanas, nem feito nenhum tratamento odontológico no mesmo período.

Dois deles eram usuários diários de gomas de mascar. Seis ingeriram peixes ou frutos do mar durante o período de observação. Todos tiveram contato com alimentos embalados com plásticos. Na média, eles tomaram 750 ml de água por dia de garrafas plásticas. Nenhum dos oito participantes era vegetariano.

Nove tipos de plásticos foram encontrados nos exames, sendo PP (material geralmente encontrado em tampinhas de garrafa) e PET (das garrafas plásticas) os mais comuns. Todas as amostras tinham contaminação – de 3 a 7 tipos de plástico. Dos dez tipos identificáveis pelo método, apenas um, o PMMA (comum em para-brisas de carros) não apareceu em nenhuma amostra. Foram encontradas partículas de PP, PET, PU, PVC, PA, PC, POM, PE e PS.

Os resultados da pesquisa, segundo os autores, sinalizariam que pelo menos 50% da população mundial apresentaria microplásticos nas fezes.

Em média, foram encontrados 20 partículas de microplástico a cada 10 gramas de fezes. “Nossa principal preocupação é o que isso significa para o corpo humano e, especialmente, o que pode significar para pacientes com doenças gastrointestinais”, comenta o médico.

“Enquanto as maiores concentrações de plástico em estudos com animais foram encontradas no intestinos, menores partículas são capazes de entrar na corrente sanguínea, no sistema linfático e chegar ao fígado”, prossegue.

“Estas são as primeiras evidências de microplásticos em humanos. Precisamos avançar mais nas pesquisas para entender o que isso significa para a saúde humana.”

Os pesquisadores ressaltam que os seres humanos estão expostos a diferentes tipos de plásticos no dia a dia. E isto é decorrente do uso cada vez mais comum desse material na indústria, sobretudo a partir dos anos 1950. É uma produção que segue crescendo, anualmente.

“Em nível global, a produção de plástico e a poluição plástica se correlacionam fortemente. Portanto, é provável que a quantidade de contaminação plástica possa aumentar ainda mais se a humanidade não mudar a situação atual”, alerta o pesquisador.

Calcula-se que entre 2% e 5% de todo o plástico produzido por ano acabe nos mares, por conta do descarte. Ali, esse material acaba se deteriorando em partículas cada vez menores – os tais microplásticos.

Assim, são consumidos por animais marinhos, entrando na cadeia alimentar – um caminho que, em última instância, traz o plástico para o organismo humano. Diversas pesquisas já detectaram quantidades significativas do material em atum, lagosta e camarão.

Outra maneira pela qual componentes plásticos chegam ao organismo humano seria porque, seja durante o processamento industrial, seja por conta da embalagem, alimentos também podem ser contaminados com pequenas partículas de plásticos.

No início deste mês, a revista Environmental Science and Technology trouxe uma pesquisa realizada por cientistas sul-coreanos em parceria com o Greenpeace que apontou a presença de microplásticos no sal de cozinha.

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