Vice da CBF acusado de desviar R$ 28 milhões reassume prefeitura e MP recorre
Presidente do TJ devolveu cargo a Gustavo Feijó e revogou bloqueio de bens e quebras de sigilos
O procurador-geral de Justiça de Alagoas, Alfredo Gaspar de Mendonça Neto, recorreu nessa terça-feira (26) contra a decisão do presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL), Tutmés Airan, que devolveu na última sexta-feira (22) o cargo de prefeito de Boca da Mata (AL) a Gustavo Dantas Feijó (MDB). O político é vice-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para a Região Nordeste e foi afastado do mandato de prefeito há um mês, após liminar concedida pela juíza Eliana Acioly Machado, provocada pela denúncia do Ministério Público Estadual de que Feijó integra uma organização criminosa formada por mais 11 pessoas, que desviou mais de R$ 28 milhões dos cofres do município, através de licitação fraudada para serviços nunca prestados.
O chefe do MP de Alagoas afirma ainda que a decisão monocrática do desembargador Tutmés ainda extrapolou os limites do recurso do prefeito pelo retorno ao cargo, ao revogar também a quebra de sigilos bancário e fiscal e o bloqueio dos bens do aliado do senador Renan Calheiros (MDB-AL), até o limite de R$ 21,7 milhões. Alfredo Gaspar afirma que sequer consta na petição inicial tais temas, até porque a quebra de sigilo ou indisponibilidade de bens em nada prejudica os interesses da administração pública, ao contrário, militam em favor desta.
“Também não há se de falar em prejuízo à administração pública com o afastamento do prefeito, uma vez que a chefia do município pode ser assumida pelo vice-prefeito e, mesmo em caso de impedimento deste, são sucessivamente chamados ao exercício do cargo o presidente e o vice-presidente da Câmara de Vereadores”, finalizou Gaspar, sem citar, inclusive, que o prefeito afastou-se do mandato desde dezembro de 2018, quando alegou que faria tratamento de saúde, por 180 dias.
No seu primeiro dia de trabalho após reassumir a prefeitura alagoana, Gustavo Feijó visitou seu aliado político e governador de Alagoas Renan Filho (MDB), que o recebeu no Museu Palácio Floriano Peixoto, sede histórica do governo alagoano, na última segunda (25).
A denúncia
A ação proposta pelo pelo promotor de justiça Bruno Baptista e pelo Núcleo de Defesa do Patrimônio Público do MP de Alagoas (Nudepat) denuncia Gustavo Feijó por fraudar licitações para se apropriar do dinheiro público, através, principalmente, da contratação de veículos.
“Os elementos probatórios colhidos apontaram que a prefeitura de Boca da Mata depositava na conta bancária da empresa Ômega Locação grandes quantias em dinheiro, posteriormente retiradas ou transferidas, pela pessoa de Antônio Thiago para os demais integrantes do suposto esquema, com a justificativa de pagamento decorrente de serviços prestados ao município. Porém, na verdade, tudo não passava de um grande simulacro, eis que a empresa contratada não prestava tais serviços aos órgãos públicos municipais, servindo apenas como corredor para saída de dinheiro da prefeitura e sua distribuição para as pessoas escolhidas por Gustavo Feijó, que nunca aparecia pessoalmente no esquema, mas agia em nome de seus prepostos, visando a permitir o locupletamento ilícito dos acusados”, diz um trecho da denúncia.
O Ministério Público de Alagoas também afirma que o suposto esquema de desvio de dinheiro envolveu o fornecimento de combustível para prefeitura de Boca da Mata por meio da utilização de dois postos de gasolina. Tais empresas pertencem a familiares ou pessoas próximas ao prefeito. Todas as fraudes praticadas contra o erário geraram um prejuízo de cerca de R$ 28 milhões, desde 2013, ano em que teria começado o esquema.
Ordem pública
O chefe do MP de Alagoas afirma ainda que não há razoabilidade no argumento do presidente do TJAL Tutmés Airan, de que a suspensão de liminar milita em defesa da ordem pública. Mas que o raciocínio deve ser em sentido contrário. E ainda expões a proporcionalidade da medida liminar a ser restabelecida, ao fixar em 180 dias o prazo de afastamento, dentro do parâmetro jurisprudencial previsto para tais casos de afastamento cautelar, com base na Lei de Improbidade Administrativa.
“Em se tratando da garantia da probidade administrativa, as medidas judiciais devem conferir primazia à administração pública e não a pessoa que nela atua. Em outros termos, entre os dois bens jurídicos potencialmente afetados pela decisão ora recorrida – vale dizer, manutenção do prefeito no cargo e probidade administrativa – há de prevalecer a regularidade dos atos administrativos (ordem pública) e a lisura e a objetividade na prática desses atos (interesse público primário), em detrimento dos interesses pessoais do agente público. […] Portanto, é evidente inexistir lesão à ordem pública, como equivocadamente entendeu a decisão monocrática, uma vez que a liminar deferida está dentro da proporcionalidade e razoabilidade, até porque o mero afastamento do gestor por si só não tem o condão de lesar qualquer dos valores tutelados pela norma de regência”, argumentou Alfredo Gaspar.