Danos com mineração

Oito evidências sugerem culpa da Braskem por afundamento em bairros de Maceió

Fala de Bolsonaro está entre indícios listados em pedido de bloqueio de R$ 6,7 bi da mineradora

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O pedido do Ministério Público Estadual e da Defensoria Pública de Alagoas para que a Justiça bloqueie R$ 6,7 bilhões da Braskem, ajuizado na madrugada de hoje (2), tenta garantir recursos da mineradora para ajuda humanitária e reparo de danos materiais, ambientais e morais, envolvendo mais de 30 mil pessoas de três bairros de Maceió (AL). Para convencer o juiz Pedro Ivens Simões de França a decidir pela indisponibilidade dos bens, as instituições listaram oito evidências que indicam a Braskem como causadora dos problemas, entre elas, a entrevista em que o presidente da República Jair Bolsonaro (PSL) atribui à mineração o afundamento na capital alagoana.

Ao revelar a medida cautelar solicitada à 2ª Vara Cível da Capital, o procurador-geral de Justiça disse em entrevista coletiva que está mais do que na hora das responsabilidades serem apuradas. O chefe do MP foi incisivo ao afirmar que “a Braskem jamais poderia minerar em uma área habitada e com falha geológica”, e ao ressaltar que, em um país sério, não precisaria nenhuma evidência maior do que o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), que é o chefe maior de todas essas agências que estão pesquisando, vir a público, em janeiro, e dizer que a mineração é responsável pelo afundamento (subsidência) que atingia inicialmente o solo do Pinheiro e também afeta os bairros do Mutange e Bebedouro.

“Isso seria bastante para apontarmos responsabilidade”, disse Alfredo Gaspar. Mas o pedido de liminar que solicita o bloqueio e prepara a ação civil pública contra a subsidiária da Odebrecht reforça a defesa pública de que as responsabilidades atribuídas à Braskem foram apuradas com base em estudos, ainda não concluídos pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), mas com evidências suficientes para peticionar e pedir a tutela do Estado.

“Não tem por que não brigar com uma agente tão poderosa quanto a Braskem. Não queremos, como em Mariana e em Brumadinho, que os cadáveres sejam rolados pela lama para poder as responsabilidades serem apuradas. E depois não venham dizer que a Defensoria e o Ministério Público se anteciparam aos laudos conclusivos. Porque, só as pessoas que estão sofrendo lá na ponta, e não é de hoje, que estão buscando socorro e esse socorro nunca chega é que sabem o que estão passando”, disse Alfredo Gaspar, acompanhado do chefe da Defensoria Pública de Alagoas, Ricardo Melro.

Chefes do MP de Alagoas, Alfredo Gaspar, e da Defensoria Publica Estadual, Ricardo Melro. Foto: Anderson Macena/Ascom MPAL

Veja um resumo das evidências apresentadas como indícios de prova de culpa da Braskem:

1ª Evidência: Relatório preliminar do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte: Quando técnicos explicitaram: “Recomendamos fortemente a instalação de uma rede de monitoramento geodésico,montada a partid do mapeamento de toda área atingida pelas fraturas (fissuras), incluindo os poços da Braskem (grifos no orriginal)

2ª Evidência: Linhas de investigação da CPRM, descritas no Relatório de Acompanhamento 03/2019: O serviço Geológico do Brasil vem trabalhando em quatro linhas de investigação, sendo que em três delas há possibilidade de participação da Braskem nos eventos, com poços instalados em região com falhas tectônicas; carvernas de origem antrópica (pela ação do homem); e intensa extração de água subterrânea, atividade também realizada pela Braskem há quase 50 anos.

3ª Evidência: Termo de audiência do professor Abel Galindo, engenheiro civil pós-graduado, que vem estudando há anos o fenômeno e enfatizou para o MP que os problemas ocorridos no Pinheiro são devidos à retirada de 500 metros cúbicos de água por hora no Mutange, pela Braskem, equivalente a mil carros -pipa por dia. Há vários meses vem afirmando que o sismo ocorrido no Bairro do Pinheiro foi induzido , por conta das atividades de mineração que afetaram falhas tectônicas existentes da região há milhares de anos [com 3,5km de profundidade]. […] Que as perfurações da Braskem podem estar ocasionando o escorregamento do solo. Que os poos da Braskem têm causado desequilíbrio de forças no subsolo da região. […] Que segundo estudos, as cavernas de 80 metros de diâmetro podem entrar em colapso no seu teto.

Tese de Abel Galindo sobre rachaduras no bairro do Pinheiro em Maceió com fragmentos ocupando vazios formados pela extração de sal-gema; e poços de extração de água

4ª Evidência – Termo de Audiência do professor Geraldo Wanderley Marques, ecólogo que ocupava o cargo de Secretário Executivo de Controle da Poluição do Estado de Alagoas à época da instalação da Braskem (antiga Salgema) em Maceió. Ao ser ouvido no MP, o mesmo aduziu: Que nunca recebeu na função de secretário pedido para autorização da empresa Salgema em Maceió, mas sim, apenas foi convidado para implantação da mesma. Que era contra a localicação da empresa, pois defendia que a área de construção era área de restinga e que estava muito próxima da cidade. […] Que na ocasião sua equipe era pequena e que um técnico o alertou sobre a tecnologia que estava sendo adotada, podendo acarretar uma futura subsidência na região. Que uma das minas que estão dentro da lagoa [Mundaú] devastou o mangezal na localidade. Que até onde pode acompanhar houve negligência de forma geral. […] Que acredita com base em hipóteses e evidências, acerca da responsabilidade da Braskem nos eventos causados no bairro do Pinheiro e adjacências.

5ª Evidência – Entrevista do Presidente da República Jair Bolsonaro sobre o bairro do Pinheiro, em 25 de janeiro de 2019, à Rádio Brumadinho, quando informou que “o afundamento do bairro do Pinheiro estaria relacionado à atividade de mineração”. Tal afirmação é de relevante valor probatório, eis que a afirmação foi dada pelo mandatário maior do Brasil, a qual todos os técnicos da CPRM estão subordinados. 

6ª Evidência – Manifestação pública do governador de Alagoas Renan Filho (MDB), em 26 de janeiro de 2019, comunicando que, de forma cautelar e diante de possível influência da exploração mineral feita pela Braskem na subsidência do bairro do Pinheiro, por meio Instituto do Meio Ambiente do Estado de Alagoas, decidiu suspender as licenças ambientais que a permitiam retirar o sal-gema. No dia 28 de janeiro, o IMA publicou portaria nº 10/2019, efetivando a decisão. 

7ª Evidência – Entrevista do senador Rodrigo Cunha (PSDB-AL), em 19 de março de 2019, no programa Doze e Dez Notícias, ao renomado jornalista Ricardo Mota, em que o parlamentar se manifesta a respeito da situação calamitosa do bairro do Pinheiro e afirma que, após reunião com geólogos da CPRM e conversa com o Secretário Nacional de Defesa Civil e com o ministro do Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto, há suspeita de a mineração ser a culpada pelo que vem ocorrendo no bairro. Posição até o presente momento não rechaçada por qualquer dos órgãos envolvidos.

8ª Evidência – Manifestação do representante da Agência Nacional de Mineração, Victor Hugo Bicca, no dia 21 de março de 2019, em audiência pública no Senado Federal, foi categórico ao afirmar que o fenômeno que atinge o bairro do Pinheiro é um “neotectonismo acelerado por ações antrópicas”, ou seja, não é apenas um fenômeno natural, mas resultante da ação do homem.

Rachaduras evidenciam afundamento no bairro do Pinheiro, em Maceió. Fotos: Abel Galindo e CPRM

Braskem nega culpa

A Braskem publicou hoje a seguinte nota, em que reafirma que não há demonstração definitiva da relação entre as atividades da mineração de sal-gema e os danos no solo de Maceió e diz colaborar com a busca das autoridades pela identificação das causas do fenômeno.

Nota à Imprensa

A Braskem tomou conhecimento pela imprensa da ação judicial proposta contra ela pelo Ministério Público do Estado de Alagoas e Defensoria Pública, cujo pedido seria de bloqueio de bens para garantir eventuais indenizações à população afetada. A Braskem reitera que vem, desde o início dos eventos no bairro do Pinheiro, colaborando junto às autoridades competentes na identificação das causas e que não há, até o momento, laudo conclusivo que demonstre a relação entre as atividades da Braskem e os eventos observados no bairro. A Braskem reafirma seu compromisso com a sociedade alagoana e com a atuação empresarial responsável, e de seguir contribuindo na identificação e implementação das soluções.

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