Contratos com a CPTM

MP pede dissolução de nove grupos do cartel de trens

Ação cobra restituição de quase R$ 1 bi por conluio de empresas

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O Ministério Público de São Paulo requereu à Justiça nesta quinta-feira, 10, a dissolução de nove grupos empresariais do setor metroferroviário por suposta formação de cartel em contratos de manutenção de 88 trens das séries 2000, 2100 e 3000 da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), firmados em outubro e novembro de 2007 (governo José Serra, do PSDB) e com aditamentos em 2011 e 2012 (governo Geraldo Alckmin, PSDB).

Por meio de ação civil ajuizada no Fórum da Fazenda da Capital, quatro promotores pedem que as empresas, entre elas as multinacionais Siemens, Alstom, CAF do Brasil e Bombardier, restituam os cofres públicos em quase R$ 1 bilhão – dos quais, R$ 706,53 milhões a título de reparação de dano material e R$ 211,9 milhões por danos morais difusos causados ao Tesouro.

Na ação, a Promotoria pede à Justiça que decrete a nulidade dos três procedimentos de licitação da CPTM que resultaram nos contratos com as empresas supostamente cartelizadas.

A ação não menciona nenhum dirigente da estatal ou agentes dos governos Serra e Alckmin. O processo mira o cartel das empresas do setor metroferroviário no âmbito da CPTM.

Também são citadas a Tejofran de Saneamento e Serviços, MPE Montagens e Projetos Especiais, Temoinsa do Brasil, MGE Manutenção de Motores e Geradores e Trans Sistemas de Transportes.

A ação de quase R$ 1 bilhão praticamente anula a possibilidade de eventuais acordos das empresas do cartel com o Ministério Público de São Paulo. Negociações estavam em curso, mas a ação proposta nesta quinta, 10, se recebida pela Justiça, coloca as sociedades na condição de rés. Para advogados que representam as empresas a ação da Promotoria barra ajustes por meios dos quais elas iriam se comprometer a pagar indenizações ao Tesouro.

O cartel metroferroviário de São Paulo foi revelado pela Siemens, em acordo de leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), órgão antitruste do governo federal, em maio de 2013. A multi alemã admitiu a prática do conluio no âmbito de contratos da CPTM e do Metrô, no período de 1998 a 2008 (governos Mário Covas, Serra e Alckmin, todos do PSDB).

O argumento central para o pedido de dissolução dos grupos empresariais é que eles não teriam atuado de acordo com suas próprias constituições, ‘formando cartel para fraudar licitações”. “Está bastante claro que as empresas, por intermédio de seus representantes, adotaram procedimento que inviabiliza sua própria existência. A finalidade lícita é pressuposto para o seu reconhecimento como entidade moral dotada de capacidade na órbita civil”, afirmam os promotores que subscrevem a ação, Marcelo Milani, Nelson Luís Sampaio de Andrade, Daniele Volpato Sordi de Carvalho Campos e Otávio Ferreira Garcia.

Os promotores invocam o artigo 2.º da Lei 6.404/76 – ‘pode ser o objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, desde que este não seja contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes’.

“Se desde a sua constituição, ou mesmo no curso de suas atividades, o escopo da empresa for antijurídico e/ou ferir a ordem pública, estará autorizada a sua dissolução ou a cassação do registro “, assinalam os promotores.

Eles alertam que muitas empresas ‘ainda mantêm contratos com a CPTM também com indícios de que foram precedidos da formação de cartel, fatos esses sob investigação em outros inquéritos civis’.
“As empresas dedicaram-se à prestação de serviços de manutenção corretiva e preventiva de trens, mas sempre o fizeram, especial e exclusivamente com a CPTM, de forma ilícita e viciada “, afirmam os promotores.

Segundo a ação, “o objetivo, ou objeto, alcançado foi decorrente de prévias e ilegais combinações, resultando em divisão de mercado e ao arrepio da esperada competitividade.”

Os promotores destacam que ‘a má fé observada não se restringiu à consecução dos contratos, ela é antecedente, foi exercida antes mesmo da deflagração dos procedimentos licitatórios e se estendeu durante todos os certames.”

“Faz- se de rigor que seja decretada a dissolução das empresas, única medida eficaz a fazer cessar a atividade ilícita e nociva ao erário e a população do Estado de São Paulo. As empresas não só descumpriram as disposições da Lei das Licitações, como também -e principalmente – afrontaram dispositivo constitucional. Fixaram preços e direcionaram licitações. Ignoraram completamente o interesse público. Dividiram o mercado e também apresentaram propostas pro forma, de cobertura.”

Os promotores alertam. “Quem mais sofreu e ainda sofre com os desmandos decorrentes da divisão premeditada das fatias desse mercado é a população de baixa renda que depende dos trens para se locomover e, assim, ter acesso ao trabalho e, em última análise, garantir a própria subsistência.”
Na avaliação dos promotores, “suprimida a competição por força da cartelização, certamente a administração pública deixou de contratar o melhor serviço”.

“Não bastasse, ainda teve que despender valores muito superiores aos praticados pelo mercado à época. Não é necessário muito esforço para se chegar a esta conclusão. Trata-se de regra básica de economia: o aumento da concorrência derruba preços e incrementa a qualidade dos produtos e serviços. Sempre foi assim e, no caso dos serviços contratados pela CPTM, não foi diferente.” 

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