TENDÊNCIA ELEITORAL

MP ignorou 43% em reajustes na tarifa de ônibus em Alagoas

Após minimizar tarifas do interior, MP nega focar gestão tucana

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O Ministério Público Estadual de Alagoas (MP/AL) surpreendeu o titular da Superintendência Municipal de Transporte e Trânsito (SMTT), Antônio Moura, ao decidir investigar o aumento de 11,11% na tarifa do transporte público de Maceió. A iniciativa publicada no Diário Oficial do Estado dessa segunda-feira (3) está sendo tratada nos bastidores da política alagoana como ato de perseguição ao prefeito Rui Palmeira (PSDB), porque o MP ignorou reajustes maiores no transporte intermunicipal definidos pelo Governo do Estado. O procurador-geral de Justiça, Alfredo Gaspar de Mendonça, afasta qualquer possibilidade de tendência político-eleitoral nas ações do MP.

A ausência de inquéritos do MP para fiscalizar os mais de 43% de reajustes acumulados desde novembro de 2015 no transporte intermunicipal é o que dá margem à interpretação de que o MP estaria fazendo parte de um jogo político contra o prefeito tucano, supostamente motivado por este ser adversário político do governador Renan Filho (PMDB).

Tarifa subiu três vezes em 13 meses nos ônibus intermunicipais (Foto: Arsal)O superintendente da SMTT, Antônio Moura, estranhou a manifestação do MP, ainda mais porque a promotora da Fazenda Pública Municipal Fernanda Moreira acompanhou todo o processo, assim como a procuradora do MP de Contas, Stella Méro, no Conselho Municipal de Transporte, em 23 de fevereiro.

“Não é de hoje que está havendo uma tendência a vir em cima dos órgãos municipais, não spo com a SMTT. Eu não sei se é uma antecipação da eleição de 2018. Mas todos estamos surpresos com esse tipo de atitude tendenciosa em relação às ações do município. Seria interessante que tivessem a mesma preocupação com as ações do Governo do Estado. Será que todas essas obras têm licença ambiental do órgão municipal também? Será que esse aumento de passagem da Arsal também preocupa o MP? Por que o Ministério Público não questiona os mais de 13% de aumento de dezembro, aprovado pela Arsal? Isso é uma questão que a gente entende como política. E é triste e lamentável”, protestou Antônio Moura.

O gestor da SMTT disse não ter nenhuma dificuldade de apresentar todas as planilhas de custo e sistemática utilizada para o Conselho Municipal de Transporte ter decidido aumentar de R$ 3,15 para R$ 3,50 o valor da tarifa. Mas ressaltou ainda que o aumento foi bem menor que o valor de R$ 3,75 que as empresas estavam solicitando. “Demos o reajuste menor que a média nacional de aumento entre as capitas, que foi de 14%. Mas estamos aqui para esclarecer qualquer problema”, concluiu o titular da SMTT.

TRÊS AUMENTOS

Em 13 meses, a Agência Reguladora dos Serviços Públicos do Estado de Alagoas (Arsal), aprovou três reajustes nas tarifas de transportes convencionais e complementares, entre municípios da Região Metropolitana de Maceió e de todo o Estado.

Em 14 de novembro de 2015, Arsal aumentou em 8,23% a tarifa, menos de três meses depois, em 14 de fevereiro de 2016, houve novo aumento de 16,57%. E, em 16 dezembro do mesmo ano de 2016, as tarifas subiram 13,65%. O acúmulo é de 38,45 pontos percentuais, o que representa um reajuste acumulado de 43,3%.

Promotor Max Martins alega ausência de representação (Foto: MP/AL)

A tarifa de transportes complementares em Alagoas varia de R$ 3,65 a 46,50, e convencionais de R$ 4,00 a R$ 48,75, entre municípios.

QUAL A DIFERENÇA?

O Diário do Poder quis saber do MP o motivo da diferença de tratamento nos dois casos. E, por meio da assessoria de comunicação do MP, o promotor Max Martins de Oliveira e Silva alegou o seguinte: “À época, não chegou nenhuma reclamação formal e nem representação na Promotoria do Consumidor contra a Arsal. Já no caso das passagens de ônibus em Maceió, isso ocorreu e em grande volume”.

O promotor que abriu o inquérito conjuntamente com a promotora Denise Guimarães de Oliveira disse ainda que se a reportagem tivesse algum material sobre a Arsal, enviasse que ele adotaria medidas necessárias. “Para abertura de qualquer procedimento, o promotor precisa de supostas provas”, explicou, via assessoria, ao tratar dos reajustes amplamente noticiados pelos meios de comunicação.

Em três meses desde o início da gestão do procurador-geral de Justiça Alfredo Gaspar de Mendonça, o MP já investiu contra a instalação da Zona Azul de estacionamento rotativo; abriu procedimento investigativo criminal para apurar contratações irregulares de 56 servidores comissionados no primeiro mandato do prefeito Rui Palmeira. E agora mira o aumento da tarifa do transporte na capital. Alfredo Gaspar foi secretário de Segurança Pública no início do governo de Renan Filho, de janeiro de 2015 a março de 2016.

DEVER DE AGIR

O fato é que o MP podia ter atuado de ofício, de forma espontânea, investigado todos os reajustes das tarifas de transporte intermunicipal anunciados pela Arsal e os meios de comunicação.

É o que garante a Lei Complementar nº 75/93, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União e faz expressa referência à atuação de ofício do Procurador Regional dos Direitos do Cidadão, em seu Artigo 12: “O Procurador dos Direitos do Cidadão agirá de ofício ou mediante representação, notificando a autoridade questionada para que preste informação, no prazo que assinar”.

MP deve garantir o cumprimento da leiA mesma previsão está na Lei Orgânica do MP, Lei nº 8.625/93, Artigo 25, VII, que relaciona entre as funções previstas: “ingressar em juízo, de ofício, para responsabilizar os gestores do dinheiro público condenados por tribunais e conselhos de contas”.

Na Lei de Improbidade Administrativa, nº 8.429/92, o Artigo 22 diz que, “para apurar qualquer ilícito previsto nesta lei, o Ministério Público, de ofício, a requerimento de autoridade administrativa ou mediante representação formulada de acordo com o disposto no art. 14, poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou procedimento administrativo”.

De acordo com o Artigo 129 da Constituição Federal, “são funções institucionais do Ministério Público: (…) II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia”.

De acordo com estudo do procurador da República Alexandre Assunção e Silva e da especialista em Ciências Criminais, Magaly de Castro Macedo Assunção, o membro do Ministério Público pode agir de forma espontânea se tomar conhecimento de uma ilegalidade e tiver competência para tanto. “É por esse motivo que ele é chamado de fiscal da lei (custos legis)”.

O diretor-presidente da Arsal, Marcus Vasconcelos, não quis comentar o assunto.

RESPOSTA DO MP

Na noite desta terça-feira (4), o chefe do MP, Alfredo Gaspar de Mendonça, enviou a seguinte resposta às informações publicadas: 

Senhor Jornalista,

Defensor que sou da liberdade de imprensa e da verdade da informação, não seria justo permitir a manipulação ou a deturpação de fatos sem o devido esclarecimento. Eleito democraticamente por meus pares, em candidatura única, à chefia do Ministério Público alagoano, assumi recentemente os destinos da instituição. Nos mais de 20 anos que venho servindo ao Ministério Público Estadual de Alagoas sempre trilhei, e só este continuará sendo o meu caminho, o profissionalismo independente, tendo como único norte a Constituição da República Federativa deste país.

Tendo a certeza que, vossa senhoria, como detentora do mínimo conhecimento sobre a estrutura administrativa do Ministério Público, bem sabe de um dos mais importantes princípios que regem a legislação da nossa instituição, que é a independência funcional de cada promotor de Justiça.

Na matéria, o autor do texto fala sobre a atuação do Ministério Público relativa a Prefeitura de Maceió, e cita a zona azul, a suposta contratação irregular de servidores comissionados e o aumento da tarifa de ônibus. É importante esclarecer que:

1 – Zona azul: em razão de lesão à ordem pública, a Promotoria de Justiça do 1º grau, com atribuições na esfera da Fazenda Pública Municipal, ajuizou ação civil pública porque ficou comprovada a adoção de errônea modalidade de licitação, o prejuízo à coletividade, a ausência de lei formal que deveria disciplinar o estacionamento rotativo, a inversão de valores com escancarada vantagem da empresa privada sobre o interesse público e que havia sido estabelecido bolsões de estacionamento sem definição de área. A ação foi aceita pelo Juízo de 1ª instância, estando, atualmente, em fase de recurso. Neste caso, por convencimento das corretas justificativas do membro do Ministério Público de 1º grau, a participação deste procurador-geral de Justiça foi interpôr o agravo junto ao Tribunal de Justiça em função da suspensão da decisão do magistrado da Vara Fazenda Pública Municipal. É de se ressaltar que, nos anos de 2012 e 2015, a mesma Promotoria de Justiça conseguiu evitar a cobrança por estacionamento rotativo;

2 – Contratação irregular de servidores comissionados: em pouco mais de três meses no cargo de procurador-geral de Justiça, determinei investigação nos municípios de Mata Grande, Pão de Açúcar, Poço das Trincheiras, Maravilha, Ouro Branco e Água Branca contra diversos ex-prefeitos, dos mais variados partidos; propus ação por ato de improbidade administrativa contra um conselheiro e dois ex-conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Alagoas; apresentei denúncia e pedi prisão contra um juiz de Direito; iniciei procedimento de inquérito civil, por suspeita de improbidade administra, contra um desembargador; suspendi o pagamento de salário de promotor de Justiça condenado por crime; emiti parecer favorável a buscas e apreensões na Assembleia Legislativa de Alagoas; defendi o recebimento de ação penal ajuizada contra deputado estadual, dentre outras manifestações de igual quilate que, inclusive, estão sob sigilo. Todas essas ações foram baseadas estritamente na defesa da legalidade e da probidade, alcançando pessoas ligadas a diversas esferas de poder e a agremiações partidárias distintas. E exatamente em função dessa postura, de intransigência ao cumprimento da lei, dei continuidade a investigação contra o prefeito da capital, que é suspeito de contratar irregularmente 56 funcionários sem a existência de cargos. A denúncia, recepcionada pelo Ministério Público em 2016, está sendo agora apurada,após delegação, por diversos promotores de Justiça que, destaque-se, têm autonomia para buscar a verdade dos fatos;

3 – Tarifa de ônibus: a correta fiscalização empreendida pela Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor, órgão de execução do Ministério Público bastante atuante e reconhecido pela sociedade, está buscando, tão somente, a proteção do interesse da coletividade, defendendo a sofrida e vulnerável população que precisa e depende do transporte coletivo. A instauração do procedimento administrativo foi motivada por representações de consumidores que se sentiram lesados e buscavam a intervenção desta instituição. Além disso, o Ministério Público investigará todos os reajustes que culminaram com a elevação dos preços das passagens de transportes intermunicipais, apesar de nunca ter sido provocado no âmbito da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor.

Prestadas essas informações, apesar do evidente desequilíbrio emocional na fala de quem é investigado, o Ministério Público continuará firme e independente na proteção do interesse público, seja quem for o poderoso de plantão.

Finalizando, registro que o único patrão a quem a instituição obedece é o povo, assim como quero acreditar que as suas escritas não estejam a serviço de interesses políticos.

Ninguém está acima da lei.

Alfredo Gaspar de Mendonça Neto

Procurador-geral de Justiça

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