Ação inútil

Renan Filho vai à Justiça contra venda da Braskem que já foi suspensa

Após ignorar apelos por vítimas de calamidade em Maceió, governador move ação inócua

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Em 2019, Renan Filho observa efeitos do afundamento em imóvel do Pinheiro, em janeiro. Foto: Márcio Ferreira/Agência Alagoas/Arquivo

O governador de Alagoas, Renan Filho (MDB), voltou esta semana da Espanha, depois de cumprir agenda privada como torcedor de futebol, após se licenciar do cargo para assistir à final da Champions League. De volta ao trabalho em Brasília (DF), onde viu o amistoso da seleção contra o Catar, seguiu ignorando apelos por sua atuação política e institucional na busca por soluções para problemas geológicos que ameaçam a vida de milhares de alagoanos, em três bairros de Maceió (AL). E, nesta sexta (7), anunciou que o Estado de Alagoas ingressou na Justiça contra uma suposta “venda fatiada” da mineradora Braskem, a fim de evitar que a causadora de danos ao solo e a imóveis dos maceioenses se desfaça de seu patrimônio e deixe de indenizar as vítimas e o Estado.

Seria uma medida importante, se o anúncio de Renan Filho não acontecesse dois dias depois de a negociação bilionária ter sido suspensa, por desinteresse da empresa holandesa LyondellBasell, justamente por causa dos danos da mineradora ao solo de três bairros de Maceió. Focado na missão de sufocar, em Brasília, a ameaça de ter de enfrentar desgastes políticos para fazer a própria reforma previdenciária estadual, o governador alagoano lembrou tardiamente da pauta prioritária para os alagoanos ameaçados por um colapso que já fez a terra tremer em 2018.

Depois de excluir a tragédia da Braskem de sua agenda de trabalho em Brasília, Renan Filho disse que, agora, vai apelar ao Palácio do Planalto. E minimizou a ausência de respostas de seu governo aos ofícios da Prefeitura de Maceió pedindo a ajuda para ações urgentes para preservar vidas de milhares de moradores dos bairros do Mutange, Bebedouro e Pinheiro.

“Muito mais do que ofício, a gente tem que estar junto. Depois desse anúncio de hoje eu vou pessoalmente ligar para o prefeito de Maceió, para o ministro da Integração Nacional, o ministro de Minas e Energia para fazer chegar ao presidente [Jair Bolsonaro], para que a gente atue integradamente”, disse o governador.

No início da semana, seu chefe da Casa Civil do governo de Alagoas, Fábio Farias, também minimizou o desdém oficial do Estado ao apelo do município. E propôs uma espécie de união das instituições em um grupo de trabalho. Mas tal grupo de trabalho já existe.

O que faltava era compromisso do Estado com as medidas necessárias, como denunciou na semana passada o prefeito Rui Palmeira. Mas desde o início da semana, a convite da Prefeitura, autoridades estaduais e a Defesa Civil Estadual trabalham juntos no planejamento das ações de evacuação das áreas de risco, a partir do novo mapa divulgado hoje, este construído sem contribuição do Estado.

Afundamento do solo em Maceió foi causado pela mineração da Braskem. Fotos: Márcio Ferreira/Agência Alagoas

Sem fatiamento

A venda da Braskem vinha sendo negociada pelo grupo Odebrecht, que detém 50,1% das ações com direito a voto. Mas nunca foi cogitado o fatiamento da negociação.

A tese do governador é de que a mineradora planejaria negociar de forma “fatiada” a Braskem, se desfazendo de unidades do Sul, Sudeste e Bahia, e deixando de vender sua estrutura em Alagoas. “Talvez, o que permanecesse dessa venda não fosse suficiente para garantir a indenização as famílias”, disse Renan Filho, ao afirmar que o governo discutia a questão há muito tempo.

A assessoria de imprensa da Braskem disse que a mineradora não comenta a iniciativa do governador. Mas quando questionada pelo Diário do Poder sobre a suposta continuidade das negociações, respondeu: “É público que a Odebrecht e a LyondellBasell suspenderam as tratativas para venda, como foi bastante divulgado nos últimos dias”.

Em abril, o desembargador do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL), Alcides Gusmão da Silva, suspendeu a distribuição de R$ 2,6 bilhões em lucros de 2018 da mineradora aos seus acionistas, em resposta ao pedido do MP Estadual e da Defensoria Pública de Alagoas por um bloquei de R$ 6,7 bilhões dos bens da mineradora. No âmbito da Justiça, a luta mais imediata dos autores da ação agora é tentar garantir o encaminhamento dos lucros bloqueados para uma conta judicial.

Pendências

A Prefeitura de Maceió e outras instituições como o Ministério Público Federal (MPF) defendem publicamente a execução de medidas emergenciais, especialmente para evacuação da população mais pobre que vive na chamada Barreira do Mutange, que se encontra em situação crítica, conforme aponta o laudo apresentado em 08 de maio pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM). Providência que não precisa esperar a conclusão do plano estratégico de ações já em andamento.

Veja o que aconteceu no solo de Maceió, segundo a CPRM, pela ação da Braskem:

Veja alguma das providências cobradas de secretarias e órgãos estaduais:

Novos aluguéis sociais para o Mutange – a Prefeitura lembra no ofício que o relatório da CPRM determina a imediata evacuação dos moradores  do bairro, principalmente das moradias localizadas nas encostas. No entanto, destaca a necessidade da liberação do aluguel emergencial por parte do Governo Federal para que haja a retirada das famílias. Como o valor liberado até agora não contempla as 2.415 famílias cadastradas no bairro, a Prefeitura solicita aporte financeiro do Estado e da União. O Município diz ainda que um novo cadastramento identificou outras 2.038 famílias que também precisam do benefício.

Demolição de imóveis – No ofício, o prefeito Rui Palmeira também solicita recursos financeiros e operacionais do Estado para a demolição dos imóveis desocupados, com o objetivo de impedir novas ocupações das áreas de risco.

Suporte para cadastramento – Embora já tenha efetuado o cadastramento de parte das famílias atingidas, a Prefeitura afirma que os estudos da CPRM recomendam a ampliação do serviço, e conta, para isso, com o apoio material e de pessoal do Estado para que processo seja mais rápido.

Veja o ofício enviado por Rui Palmeira a Renan Filho.

Veja os outros requerimentos encaminhados pelo Município a secretarias e órgãos estaduais:

SEADES – Ofício nº 351/2019/SMG

SESAU – Ofício nº 354/2019/SMG

SSP – Ofício nº 353/2019/SMG

DEFESA CIVIL ESTADUAL – Ofício nº 352/2019/SMG

DETRAN – Ofício nº 355/2019/SMG

A mineradora Braskem diz estar comprometida em busca de solução definitiva para o problema.

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