Motor de impunidade

TJ de Alagoas não prioriza ações sobre crimes contra a crianças e adolescentes

Sem vara especializada, vítimas têm atenção dividida com crimes de trânsito e contra idosos

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Sede do Tribunal de Justiça de Alagoas (Foto: Dicom TJAL)

O Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Zumbi dos Palmares (Cedeca) alertou ao presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL), desembargador Otávio Leão Praxedes, sobre os problemas para a promoção da justiça contra crimes contra crianças e adolescentes no Estado de Alagoas. No ofício enviado na última sexta (21), o Cedeca solicita o desmembramento da 14º Vara Criminal da Capital, que divide sua atenção com os temas díspares como crimes de trânsito, contra idosos e contra crianças e adolescentes.

A entidade de defesa da criança e dos adolescentes pede a criação de uma vara especializada e ressalta que a prevalência do interesse maior das crianças “é corolário ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana esculpido no inciso III do artigo 1º da Constituição Federal”.

O Cedeca ainda cita a Recomendação nº 33/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para que tribunais criem serviços especializados para escuta de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência nos processos judiciais.

“É necessário pontuar que unir três temas tão díspares e que não possuem relação entre si em uma única vara criminal evidentemente acaba por banalizar a competência desta para atuar de forma adequada e especializada sobre os crimes cujas vítimas sejam as crianças e os adolescentes. Doutra banda os instrumentos internacionais de direitos humanos reconhecem a prevalência absoluta do interesse maior das crianças”, argumenta o Cedeca.

Sobrecarga e deficiências

No ofício, a entidade considera evidente a necessidade de considerar as especificidades que requer o trabalho de uma vara especializada, bem como a carência de uma equipe multidisciplinar, capacitada para atuar em todas as etapas dos processos, com espaço físico apropriado.

O ofício ao presidente do TJAL pede que seja considerado o volume das demandas, já que os dados oficiais apontam para uma evidente sobrecarga de trabalho na 14º Vara, que tem 3.249 processos em andamento. O volume corresponde a, em média, o triplo das outras varas, comparável apenas à 15º Vara Criminal, que trata do combate ao tráfico de drogas.

“Lembra-se ainda que 2.005 do total dos processos corresponde a crimes de trânsito. A 14º vara, também, é a única com competência territorial sobre Maceió para o tema [da criança e do adolescente]”, diz outro trecho do ofício do Cedeca.

Além de afetar a proteção de crianças e adolescentes vítimas de crimes, a situação da 14ª Vara é um dos empecilhos que favorecem a impunidade no conhecido caso contra o adolescente Davi da Silva, vítima de tortura e homicídio ao ser flagrado por policiais militares fumando um cigarro de maconha, na periferia de Maceió, na manhã do dia 25 de agosto de 2014.

Demanda antiga e sem respostas

O Cedeca já participou de audiência sobre o tema no TJAL, com a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e a participação de representantes do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes e serventuários da 14º Vara, tratando do tema acima exposto.

A assessoria de imprensa do TJAL informou que “o presidente [Otávio Praxedes] de fato já recebeu o ofício mas ainda está analisando. Também não tem uma posição para dar no momento”.

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