Vidas x economia

Renan Filho fala em manter mineração da Braskem que ameaça 30 mil maceioenses

Governador de Alagoas defende manter produção da mineradora, 'sem riscos para o alagoano'

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Ausente na audiência pública da última quarta (8) que expôs, com dados científicos, a mineração sobre uma falha geológica como causa de uma das maiores tragédias do Estado de Alagoas, o governador Renan Filho (MDB) ponderou sobre os riscos objetivos à vida de cerca de 30 mil alagoanos e falou de seu desejo de manter a mineradora Braskem funcionando “desde que não traga riscos para o cidadão alagoano”. A declaração foi dada na última sexta-feira (10), dois dias depois de a Braskem ser identificada em laudo técnico do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) como causadora de tremores de terra e afundamento de pelo menos 40 centrímetros na região de três bairros de Maceió (AL).

Segundo a CPRM, a Braskem não poderia ter ignorado ou desconhecido a existência dos riscos de extrair sal-gema da mina localizada sobre uma falha geológica que foi reativada pela perfuração de 35 poços ao longo de 44 anos, e por isso voltou a se movimentar, após milhões de anos adormecida pela natureza.

“Com o laudo da CPRM, o governo do Estado suspendeu as licenças de operação da Braskem e a Agência Nacional de Mineração também. Por isso eles resolveram paralisar a operação da indústria. Nós depois disso vamos com serenidade conversar para que não traga impacto econômico que eventualmente a empresa continue produzindo desde que não traga riscos para o cidadão alagoano”, ponderou Renan Filho, em entrevista à TV Gazeta de Alagoas.

Na mesma entrevista em que revela a intenção de preservar a atividade que segundo a CPRM ainda ameaça provocar uma subsidência (afundamento) abrupto do solo dos bairros do Pinheiro, Mutange e Bebedouro, o governador de Alagoas fala em responsabilizar culpados. E ainda isenta o órgão estadual licenciador, o Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA) que mesmo sem condições técnicas de produzir contraprova aos dados apresentados pela Braskem sobre suas atividades de altíssimo risco, seguiu concedendo e renovando licenças para a mineradora.

“Olha as informações normalmente são prestadas pela própria para empresa. Por isso a empresa foi multada, por não prestar informações com a devida fidedignidade ao IMA. A Agência Nacional de Mineração [ANM) também só suspendeu as licenças depois do laudo da CPRM, que levou quase seis meses para ser elaborado. Então esse caso é um caso complexo, todos os responsáveis precisam ser devidamente responsabilizados. É assim que o estado de Alagoas vai tratar e é isso que a gente tem cobrado”, declarou.

Conforme dados da Justiça Eleitoral, quando foi eleito para seu primeiro mandato de governador de Alagoas, nas eleições de 2014, Renan Filho recebeu R$ 320 mil de doação de campanha da Braskem e R$ 829 mil da Odebrecht, controladora da mineradora.

A incapacidade técnica do órgão licenciador da atividade em Alagoas para fiscalizar os 35 poços perfurados ao longo de 44 anos pela Braskem foi evidenciada em 22 de fevereiro pelo próprio instituto, em audiência pública promovida pela Assembleia Legislativa de Alagoas (ALE). Na ocasião, o representante do IMA admitiu a ausência um geólogo efetivo ou comissionado nos quadros do órgão administrado pelo governo de Renan Filho, bem como a falta investigação técnica da atividade da Braskem, que fez afundar três bairros de Maceió.

O Ministério Público Federal (MPF) também pode buscar a responsabilização do IMA e da ANM pela tragédia, segundo adiantou a procuradora da República Niedja Kaspary, na quinta-feira (9), em reunião que discutiu detalhes do laudo da CPRM, com o corpo técnico do órgão federal.

O Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) já suspendeu a distribuição de R$ 2,6 bilhões de lucros para acionistas da Braskem, em resposta ao pedido de bloqueio de R$ 6,7 bilhões no patrimônio da subsidiária da Odebrecht, formalizado pelo Ministério Público e Defensoria Pública Estadual, que solicitaram a suspensão das atividades da mineradora e reforçam o pedido de bloqueio dos bens, após a audiência da semana passada.

Desastre atinge solo do bairro do Pinheiro, desde 2018. Foto: Marco Antônio/Secom Maceió/Arquivo

Impacto na economia

Em estudo recente do programa de pós-graduação do Instituto de Geografia, Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Alagoas, Railson Vieira Diodato relata que Alagoas possui relevância nacional no cenário petroquímico, por contar com a maior planta de processamento de cloro-soda e PVC da América Latina, da mineradora Braskem, ao explorar esta que é a maior jazida de sal-gema do Brasil.

O estudo afirma que a Cadeia Produtiva da Química e do Plástico de Alagoas tem 104 indústrias, gerando 4.427 empregos diretos em 27 tipos de atividades econômicas, sendo a maioria para fabricação de fabricação de produtos químicos, farmoquímicos e farmacêuticos, borracha e material plástico.

Os impactos na arrecadação e nas políticas públicas do Estado de Alagoas ainda estão sendo calculados. Mas já se tem conhecimento de um número: 30 mil vidas ameaçadas e outros milhares de imóveis nos bairros que podem deixar de existir justamente pela ação da mineração da Braskem.

Como a jazida de sal-gema explorada é fixa e intransferível, a ponderação do governador precisará se amoldar a realidade da gravidade dos fatos, caso queira mesmo eliminar riscos à vida do cidadão alagoano.

Veja a situação dos poços de mineração da Braskem, relatada pela CPRM:

Veja aqui a posição da Braskem.

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