Descaso inaugurado

Paciente com covid-19 morre em novo hospital de Maceió, sem fazer tomografia após 17 dias

Ao contrário do que disse, Renan Filho inaugurou novo hospital sem tomógrafo funcionando

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Inauguração do Hospital Metropolitano de Maceió. Foto: Márcio Ferreira/Agência Alagoas

Inaugurado “às pressas”, mas com atraso de dois anos desde o descumprimento da promessa de reeleição do governador Renan Filho (MDB), o Hospital Metropolitano de Maceió foi entregue aos alagoanos há 18 dias como reforço necessário ao combate à pandemia do novo coronavírus. Além das 30 UTIs e de 130 leitos clínicos, a tomografia computadorizada no próprio hospital foi exaltada pelo governador como procedimento disponível e imprescindível para investigação da Covid-19. Mas a família da servidora pública estadual Maria do Carmo Oliveira Vieira, de 68 anos, internada no hospital desde o dia 17 de maio vive nesta quarta-feira (3) a dor de tê-la visto falecer sem ter atendidos os apelos para que ela fosse examinada pelo tomógrafo, durante os 17 dias de seu tratamento.

Ao contrário da propaganda institucional que exaltava a tomografia como disponível para os alagoanos, há pelo menos uma semana, até a noite de ontem (2), o filho da paciente ouvia junto ao boletim médico a informação de que a verificação da evolução da doença nos pulmões de sua mãe ainda não tinha sido feita com auxílio do tomógrafo, porque o equipamento não estava funcionando.

“O tomógrafo até agora não está pronto para fazer exames nos pacientes. Disseram que já começaram a montar, mas ainda sem previsão para ele estar disponível para exames”, disse ao Diário do Poder César Augusto, filho da paciente, na noite de ontem, depois de ser comunicado sobre a piora de sua mãe, com trombose. Ela morreu hoje, com parada cardíaca, depois de o filho ouvir diariamente a mesma ladainha dos médicos sobre o tomógrafo: “Não está funcionando”.

Não bastasse o problema com o tomógrafo, César Augusto sequer teve a comprovação do diagnóstico de covid-19, e tenta reconhecer nesta tarde, com sua irmã, o corpo de sua mãe. “Estou no Hospital Metropolitano com minha irmã para reconhecer o corpo de minha mãe. Só querem deixar entrar uma pessoa, mas estão negando a cópia do prontuário e relatório completo dos exames de minha mãe. O primeiro exame deu negativo para covid-19, na UPA do Jacintinho. E não consta no LACEN a requisição deste segundo exame, que negam me informar a data”, relatou o filho da funcionária pública do Ipaseal.

Leitos do Hospital Metropolitano de Maceió. Foto: Márcio Ferreira/Agência Alagoas

Problemas de infraestrutura

Depois de uma semana de silêncio da Secretaria de Saúde de Alagoas diante dos questionamentos enviados pela reportagem sobre o problema, somente hoje a Direção do Hospital Metropolitano de Maceió admitiu que o hospital foi entregue sem o tomógrafo em funcionamento. Mas garantiu que o equipamento funciona desde segunda-feira (1º), cumprindo uma escala de atendimento de acordo com a solicitação dos médicos. A reportagem apurou que o equipamento chegou apenas no dia 26 de maio.

“O tomógrafo chegou uma semana depois da abertura do hospital. Mas teve essa questão de instalar o equipamento e fazer essa parte de infraestrutura, de construção mesmo por parte da construtora. Ele está funcionando desde segunda-feira”, disse ao Diário do Poder o médico Marcos Ramalho, diretor-geral do Hospital Metropolitano de Maceió, ao alegar que o hospital prometido para 2018 foi entregue em 16 de maio com “45 dias de antecipação”.

Quando questionado sobre a falta de exame dessa paciente da UTI, o diretor do hospital minimizou a importância do uso, em alguns pacientes, do equipamento considerado por especialistas e exaltado pelo governador Renan Filho como imprescindível para o diagnóstico e acompanhamento da evolução da covid-19.

Ramalho acredita que o que pode ter acontecido é que o médico assistente solicitou o exame e a incluiu na programação da radiologia para fazer os exames, no universo de mais de 100 pacientes, segundo o diretor.

“A tomografia é importante para o diagnóstico, mas ela não define tanto a conduta [médica]. Muitas vezes a gente pede a tomografia para avaliar se está evoluindo, como está evoluindo, mas ela não define a conduta. A tomografia é muito mais importante, no início, para saber se o paciente tem dispneia ou não. Ele pode melhorar clinicamente, e a tomografia ainda estar ruim. Se tem um paciente que está com dispneia e a gente não sabe e tem outro que a gente já sabe e a tomografia é só para ver se houve melhora ou não, o que vale é o paciente que eu ainda quero saber o que é”, explicou Ramalho.

Sobre o uso da tomografia em um quadro de evolução para coagulação sanguínea, o diretor do hospital disse que o exame mais importante é o ultrassom com doppler, que segundo Ramalho é utilizado nos pacientes com covid-19 desde a abertura do hospital, como no caso de trombose causada pela evolução da doença.

“Este é o total descaso com os alagoanos. Tanta propaganda para nada sobre a inauguração deste bendito hospital”, disse César Augusto, ao denunciar a ausência do tomógrafo. Ele disse ser mentira que o equipamento funcione desde segunda. “É mentira, pois os médicos sempre disseram que estava montando”, concluiu.

Após a publicação desta matéria, a Direção do hospital explicou que a família entraria junto com o carro da funerária para fazer o reconhecimento do corpo. E sobre acesso ao prontuario, esclareceram que, em todo hospital no momento do óbito, o acompanhante recebe o “resumo de alta”. “Para ter acesso ao prontuario, eles precisam solicitar através da formulário do Serviço de Arquivo Médico e Estatistica (SAME)”, disse Marcos Ramalho.

 

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