Desrespeito à fila

Médico denuncia ‘aberração’ na quitação de precatórios e TJAL esclarece pendências

Dívida seria de R$ 5,5 milhões, em 2013; mas foi recalculada para R$ 691,5 mil, em 2014

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Hemerson Casado Gama é cirurgião cardíaco diagnosticado com ELA e é ativista de direitos de pessoas com doenças raras (Foto: Divulgação)

Enquanto o Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) celebra a eficiência de ter liberado R$ 80 milhões em precatórios nos últimos dois anos, o cirurgião cardiovascular Hemerson Casado Gama denunciou que famílias como a sua vivem sofrendo, tristes e indignadas, há mais de 20 anos esperando pelo pagamento das dívidas por parte do Estado de Alagoas. O médico denunciou que sua mãe de 82 anos, Solange Casado Gama, esperava um pagamento na 25ª posição da fila e deixou de receber porque 75 credores passaram à sua frente. Além disso, a dívida seria de R$ 5,5 milhões, em 2013; mas foi recalculada para R$ 691,5 mil, em 2014.

O TJAL esclarece que há pendências quanto ao cálculo do valor a receber em nome do espólio do pai do médico ativista com esclerose lateral amiotrófica (ELA), Aroldo Gama da Silva, falecido em 1996; bem como há indefinição jurídica sobre a divisão do valor entre os herdeiros.

No desabafo de Hemerson Casado publicado em uma rede social, o médico fala que sua família passa necessidades por causa do crédito a receber há cerca de 40 anos, desde que seu pai teve uma casa desapropriada pela Prefeitura de Maceió para dar lugar a uma avenida.

Hemerson Casado lembra que a Lei dos Precatórios sofreu intervenção por parte do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) obrigou o recálculo de todos os precatórios que já estavam na extensa lista do TJ de Alagoas.

“Essa é uma incongruência terrível entre os contadores da Prefeitura e do Tribunal de Justiça do Estado. O ministro do Supremo, Joaquim Barbosa, aportou em Maceió com sua tropa de contadores e, num passe de mágica, determinou a redução de 90% do valor que tínhamos direito de receber. Minha mãe ficou privada de muitas coisas. O Tribunal de Justiça de Alagoas precisa ter a sua independência respeitada. Temos o dever de pagar as nossas contas, sob pena de ter serviços básicos cortados. Mas o governo tem o direito de pagar quando quer, causando sofrimento e humilhação”, protestou o médico, através de sua assessoria.

Ele ainda chama de irresponsabilidade o fato de sua mãe de 82 anos ter sido alvo do que chamou de aberração, ao deixar de ser prioridade na fila. “Um verdadeiro crime”, condenou.

O CNJ determina que os repasses sejam feitos pelos tribunais dos estados e do Distrito Federal em ordem cronológica. E a Câmara dos Deputados instituiu comissão especial para discutir a criação de um regime especial de pagamento de precatórios, com prazo máximo de dez anos.

“Espero que o Tribunal de Justiça de Alagoas tenha o zelo de apreciar essa matéria com muita sensibilidade e senso de justiça. A minha confiança na justiça é total e não medirei esforços para lutar pelos direitos da minha família para reaver cada centavo em honra da história do meu nobre e saudoso pai”, finalizou Hemerson Casado, que disputou eleição em outubro e não conseguiu se eleger deputado federal.

Insegurança jurídica

O Diário do Poder pediu esclarecimentos sobre a denúncia e o Setor de Precatórios do TJAL enviou a seguinte resposta:

Em relação aos cálculos, a questão é a seguinte:

1. As informações solicitadas versam acerca de requisição de pagamento expedida em nome de SOLANGE CASADO GAMA, JOSÉ AROLDO CASADO GAMA, LUCIANA MOUSINHO LUCENA GAMA, HUMBERTO CASADO GAMA, HEMERSON CASADO GAMA, HELVIO CASADO GAMA e ADRIANA MARIA DO NASCIMENTO GAMA.

2. No caso em exame, o precatório nº 0001410-14.2013.8.02.0000 foi recebido na Diretoria de Precatórios em 31/01/2013, com o valor de R$ 5.573.226,22 (cinco milhões, quinhentos e setenta e três mil, duzentos e vinte e seis reais e vinte e dois centavos) atualizado até 14/07/2011.

3. Ocorre que, durante a correição realizada pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ – no Setor de Precatórios desta Corte de Justiça – em junho de 2014, constataram-se no referido requisitório alguns erros materiais referentes aos cálculos originariamente apresentados, quais sejam: juros compensatórios compostos, sem autorização no título judicial para tal procedimento; incidência de juros com anatocismo (juros sobre juros); além da aplicação de juros de mora no período em que não eram devidos.

4. Assim, apontou o próprio CNJ que o valor realmente devido aos credores, atualizado em 1º de junho de 2014, seria de R$ 691.517,85 (seiscentos e noventa e um mil, quinhentos e dezessete reais e oitenta e cinco centavos).

5. Cumpre frisar que a atualização efetuada obedeceu rigorosamente aos parâmetros que deram origem à requisição, alterando-se apenas a forma de cálculo dos juros compensatórios, que passou de juros compostos para juros simples, por não haver a previsão daquele no título judicial que deu origem ao requisitório.

6. Consoante se infere, em momento algum há a autorização para a aplicação de juros compensatórios compostos, nem poderia, haja vista o disposto no art. 15A do Decreto-Lei n.º 3.365/1941 (que dispõe sobre desapropriações por utilidade pública), que veda o cálculo de juros compostos.

7. Há que destacar que as próprias partes, no inventário nº 0001697-33.119.8.02.0001, em trâmite na 21ª Vara de Sucessões, avaliaram o imóvel desapropriado em R$ 50.000,00, embora pretendam receber um valor de mais de 12 milhões por ele.

8. Em relação ao não pagamento: mostra-se temerosa a expedição de alvará para pagamento do precatório sem que haja definição expressa pelo juízo da execução ou do inventário acerca do pertencimento ou não destes valores ao espólio de AROLDO GAMA DA SILVA, bem como sem que haja explícita divisão da quantia que cabe a cada um dos credores, já que o título executivo não foi expresso e os quinhões hereditários não são necessariamente iguais, como, inclusive, consta na proposta de partilha apresentada pelas partes no inventário.

9. Como se não bastasse, caso efetivamente o bem pertença ao espólio, o pagamento da requisição, no momento, implicaria na ausência de recolhimento do ITCD, com prejuízo do interesse público, e a possibilidade de pagamento apenas após a juntada formal de partilha, nos termos da Resolução 115/2010 do CNJ.

10. Em resumo, foi reservado o dinheiro suficiente para pagamento do precatório, caucionando-se o valor em conta aberta especificamente para os requerentes, até que eles regularizem a situação de representação do espólio, dizendo quem são os herdeiros e quanto é devido a cada um deles.

11. Como o dinheiro já está reservado para eles e apenas não foi liberado, podem ser pagos os demais credores segundo a ordem cronológica.  

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