‘Guerra ao crime’ é ineficaz e cara, na Alagoas onde o estupro cresceu 158%
Polícia matou 80% a mais e estado mantém violência de países em guerra
A redução de 14% de mortes decorrentes de crimes em Alagoas, entre 2014 e 2017, não tirou o estado de patamares inadmissíveis de violação do direito humano à vida. Esta é a conclusão do advogado e consultor associado ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Pedro Montenegro, que classificou como insustentável, cara e sem efetividade a política de “guerra ao crime”, intensificada em 2015, no governo de Renan Filho (MDB), ao custo de cerca de R$ 1 bilhão ao ano.
O texto de Pedro Montenegro que analisa os dados da política de segurança pública de Alagoas está publicado no “Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2014 a 2017”. A publicação afirma que Alagoas mantém um estoque de mortes violentas intencionais que superam as taxas nacionais e de países que passaram por conflitos bélicos recentes.
A taxa de mortes foi de 56,9 por 100 mil habitantes, com 1.921 vítimas de crimes letais e intencionais em Alagoas, em 2017. O que deixa o estado na ainda alarmante 5ª posição no ranking nacional da violência, mesmo depois de um período de quatro anos, em que a letalidade policial foi ampliada em 80%, com a polícia matando suspeitos nas abordagens.
Ainda de 2014 a 2017, houve um crescimento de 158% de vítimas de estupro, no Estado em que delegacia da Mulher não atende regime 24h, nem nos fins de semana. Também aumentaram em 49,5% os casos de pessoas desaparecidas.
“O impiedoso quadro da violência em Alagoas, descortinado nos números do Anuário, denota os limites das políticas públicas para a área de segurança baseadas apenas na repressão policial, traduzida no carcomido clichê da “guerra ao crime”, diz Montenegro, no Anuário.
Maior gasto do nordeste
O consultor conclui que, entre 2014 e 2017, a melhoria da governança na gestão da Secretaria de Segurança Pública Estadual não apresenta efetividade e se revela incapazes de produzir resultados permanentes.
“Essa insustentabilidade é patenteada pelo elevado custo econômico da criminalidade
em Alagoas. Segundo o relatório ‘Custos Econômicos da Criminalidade no Brasil’ (BRASIL,2018), o estado comprometeu, em 2015, 5,2% com referência à fração do PIB, o maior custo do
Nordeste e o terceiro no Brasil”, conclui Montenegro.
Enfim, integração das inteligências das policias; orientação e intensificação das operações policiais com base nas estatísticas das manchas criminais; aumento em quase 30% na apreensão de armas de fogo nesses quatro anos, criação do Departamento de Homicídios e insulados de políticas de prevenção à violência foram ineficazes.
“A inadequação das políticas de segurança pública centradas exclusivamente na repressão é cada vez mais ampla, profunda e grave. O desacoplamento entre essas políticas que entendem a criminalidade como um fenômeno de unicausalidade e o problema cada vez mais multidimensional
da violência vêm contribuir para o persistente quadro de insegurança em Alagoas”, diz o consultor do Fórum Brasileiro da Segurança Pública.
A situação da violência em Alagoas reproduz o padrão nacional de vitimização: 94,1% das mortes
foram de homens; 62,6% concentraram-se na faixa etária dos jovens de 15 a 19 anos e em
82,1% as vítimas não brancas.
O tema será discutido amanhã (13) e sexta (14), no “Seminário Homicídios no Nordeste, causalidades, políticas públicas e perspectivas”, no auditório da Reitoria da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), em Maceió (AL).
Outro lado
A SSP de Alagoas enviou nota, em que exalta os dados positivos do Anuário, justificando por exemplo, o alto número de mortos em abordagens policiais, sem citar, por exemplo, aquela que resultou no homicídio doloso e duplamente qualificado contra os irmãos com deficiência intelectual, Josivaldo Ferreira Aleixo, 18, e Josenildo Ferreira Aleixo, 16, mortos em abordagem policial na periferia de Maceió, em março de 2016.
Leia a nota: